Violência entre torcidas organizadas é tema de evento em Belo Horizonte

Torcedores do São Paulo agridem flamenguista em frente ao Estádio Nacional Mané Garrincha, em Brasília (Foto: Reprodução/TV Globo)

Brasil é 1° no ranking de mortes por crimes relacionados ao esporte.
Segundo pesquisador, violência reflete problemas sociais.

O tema da violência no futebol brasileiro será abordado nesta terça-feira (20), em um encontro promovido pelo Núcleo de Estudos sobre Futebol, Linguagem e Artes (Fulia), da Faculdade de Letras (Fale), da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Segundo a organização do evento, o objetivo é fomentar a proposição de um plano estratégico de segurança pública para o futebol brasileiro em curto, médio e longo prazos, uma vez que o Brasil ocupa o primeiro lugar em mortes comprovadas de torcedores de futebol em consequência de conflitos envolvendo as torcidas organizadas.

Um torcedor do Flamengo teve fratura na mandíbula, e lesões na testa e no queixo, depois de se envolver em uma briga entre torcedores do time carioca e do São Paulo, em frente ao Estádio Nacional Mané Garrincha, em Brasília, na tarde deste domingo (18). O confronto aconteceu momentos antes da partida entre as duas equipes, na parte de dentro da grade em volta do estádio. Simpatizantes dos dois clubes se provocavam antes do conflito.
Só no ano passado, foram registradas 23 mortes por consequência de conflitos envolvendo esses grupos organizados de torcedores; uma média de 1,91 mortes por mês. Os números de 2012 equivalem ao total dos dois anos anteriores somados (2010, com 12 mortes, e 2011, com 11), o que indica um aumento significativo nos problemas de violência entre torcedores do futebol. Este ano, números registrados até julho totalizam 13 mortes em seis meses, cerca de duas mortes a cada mudança de seção no calendário, segundo a organização do seminário em Belo Horizonte.
Os números fazem parte de um amplo estudo que, há duas décadas, busca analisar a relação entre a violência e o futebol no Brasil e no mundo. A princípio, o título de primeiro no ranking mundial de violência entre torcedores é assustador. Contudo, segundo o pesquisador da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ), Maurício Murad, os crimes tem menos a ver com o futebol e mais a ver com reflexos de problemas sociais.
“O futebol é a modalidade esportiva mais popular em quase todo o mundo. Mais do que um esporte, é uma representação da cultura coletiva. Em países como o Brasil, então, nem se fala. É coletivo e apaixonante. E, como sabemos, a paixão tudo exacerba, tudo acentua, para o ‘bem’, ou para o ‘mal’.", explica. O segundo lugar na lista fica com a Argentina, com sete mortes até julho deste ano, e o terceiro, com a Itália, que tem cinco mortes no mesmo período.

Estatísticas comprovam que atos de violência relacionados ao futebol são praticados por cerca de 5% dos torcedores, segundo diz o pesquisador. E estes 5% são relativos às torcidas organizadas, e não ao número total de torcedores, o que afasta ainda mais a ideia de que o futebol provoca a violência.
Contudo, os números de crimes dos últimos anos não negam a existência do problema nesse meio. Em seu livro “A violência e o futebol: Dos estudos clássicos aos dias de hoje”, um produto do estudo, lançado em 2007, Murad explica que as preocupações com relação à violência devem ser principalmente direcionadas a determinados grupos infiltrados nesses coletivos de torcida; “Uma minoria perigosa, armada, treinada e, pior, articulada com outras “ tribos” urbanas envolvidas com distintas práticas de violência”, como tráfico de drogas, de armas, entre outros.
Dessa forma, a simples punição das torcidas por determinados crimes não atinge, de fato, o criminoso. “No âmbito cível, as torcidas, enquanto coletivos, podem ser alcançadas pela figura da responsabilidade solidária”, afirma o pesquisador, em entrevista concedida ao G1. Entretanto, ele explica, como reflexo dos problemas sociais, a violência entre torcedores deve ser abordado antes mesmo de chegar até as torcidas organizadas. “É preciso desenvolver um plano estratégico nacional, com medidas interligadas de curto, médio, e longo prazos; medidas de repressão, prevenção e reeducação”, conclui o sociólogo, que lançou, no ano passado, o livro "A violência no futebol", que atualiza os dados da pesquisa e traz novas reflexões sobre o assunto.
A palestra 'Para entender a violência no futebol brasileiro', com o professor Mauricio Murad, da Universidade Estadual do Rio de Janeiro, tem entrada gratuita, e será realizada na Biblioteca Estadual Luiz de Bessa (Teatro José Aparecido de Oliveira), na Praça da Liberdade, às 15h. O encontro é promovido em parceria entre a Secretaria de Estado de Cultura de Minas Gerais e a Faculdade de Letras da UFMG. Inscrições e informações pelos telefones (31) 3269-1214 e 3269-1209.
Veja abaixo alguns casos recentes de violência no futebol em Belo Horizonte e na Região Metropolitana
Data Fato
Agosto de 2013 Uma pessoa morreu e outras duas ficaram feridas depois que o ônibus em que elas estavam foi alvo de tiros durante a madrugada. De acordo com a Polícia Militar (PM), o coletivo estava em Contagem, na Região Metropolitana de Belo Horizonte, quando um carro ficou lado a lado, e um homem atirou várias vezes em direção aos passageiros. O ônibus, conforme informou a PM, estava cheio, principalmente, de torcedores que voltavam da festa do Atlético-MG, realizada na Praça Sete, no Centro da capital mineira.
Dzembro de 2012 Antes do clássico entre Atlético-MG e Cruzeiro, um telespectador filmou uma confusão entre torcedores, em Contagem, na Região Metropolitana de Belo Horizonte. O incidente ocorreu nas proximidades da estação de ônibus e metrô do bairro Eldorado. Alguns torcedores carregavam barras de metal. Pelo menos duas pessoas, aparentemente feridas, foram socorridas por colegas.
Outubro de 2012 Um torcedor do Atlético-MG foi baleado durante uma briga de torcidas em um bar no bairro Barro Preto, em Belo Horizonte. De acordo com a Polícia Militar, um grupo de atleticanos assistia ao jogo contra o Sport no bar, quando chegaram vários cruzeirenses. Houve confusão, e um dos cruzeirenses teria atirado no atleticano. Cerca de dez torcedores foram detidos.
Agosto de 2012 Uma briga entre torcidas organizadas do Cruzeiro no metrô em Belo Horizonte acabou com 18 pessoas detidas. Funcionários da Companhia Brasileira de Trens Urbanos (CBTU) informaram que, durante a confusão, alguns vagões do metrô e as dependências da estação no bairro Santa Tereza, na Região Leste da capital mineira, foram depredados. Segundo a PM, os suspeitos eram integrantes de torcidas organizadas rivais com sede em Belo Horizonte. Todos os detidos foram ouvidos e, depois, liberados.
Novembro de 2010 Um jovem de 19 anos foi espancado até a morte na saída de um campeonato de vale-tudo em um ginásio na Região Centro-Sul de Belo Horizonte. Câmeras de segurança de um shopping registraram tudo em vídeo. Segundo a denúncia do Ministério Público, 12 pessoas foram acusadas. Eles eram torcedores do Atlético-MG e, quando souberam da chegada de membros da torcida rival, saíram da casa de shows e agrediram cinco corcedores com paus e cavaletes. Dois dos acusados foram condenados a 14 anos de prisão. Na época, eles eram os líderes da torcida organizada. Quatro ainda aguardam julgamento.

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