José Sarney Filho e Blairo Maggi (Foto: Alan Marques/Folhapress e Fernando Vilarin / Editora Globo) |
Temer nomeia, ao mesmo tempo, um ministro com bom trânsito entre
ambientalistas e outro com um histórico de polêmicas ambientais
A posse do
deputado Sarney Filho
(PV-MA), escolhido pelo
presidente interino Michel Temer para ocupar a o Ministério do Meio Ambiente,
foi recebida como um bom sinal por ambientalistas. O deputado tem
experiência na área: já esteve à frente da pasta durante o governo de Fernando
Henrique Cardoso, entre 1999 e 2002. Sarney Filho assumiu o ministério na tarde
de quinta-feira (11), durante uma cerimônia no Palácio do Planalto. Tem, à sua
frente, o desafio de mostrar que sua experiência basta para apagar os
frequentes "incêndios" ambientais nas grandes obras brasileiras, como
vazamentos de petróleo,rompimento
de barragens e a insitente continuidade
do desmatamento ilegal na Amazônia. Porém, assume um governo que
apresenta sinais contraditórios sobre como pretende lidar com o meio ambiente e
a sustentabilidade.
José Sarney Filho
e Blairo Maggi (Foto: Alan Marques/Folhapress e Fernando Vilarin / Editora
Globo)
Sarney Filho deverá contar, num primeiro
momento, com o apoio da sociedade civil - algo que o governo federal não tem
desde a saída de Marina Silva da pasta, em 2008. Zequinha Sarney, como é
conhecido entre os colegas de ativismo, tem bom histórico. Foi um dos
fundadores e líderes da Frente Parlamentar Ambientalista. Alguns programas
ambientais bem-sucedidos hoje começaram na sua gestão no ministério, como o Projeto Tamar, de proteção das tartarugas marinhas. Nos três anos em que controlou a
pasta, ele regulamentou a Lei de Crimes Ambientais e tornou mais rigorosas as
regras de proteção de florestas em áreas privadas. Essas regras seriam
flexibilizadas uma década depois, em 2012, quando o Congresso aprovou a mudança
no Código Florestal.
Entre os projetos que não vingaram está a
criação do Santuário
de Baleias do Atlântico Sul, uma área marinha em águas
internacionais que nunca conseguiu ser aprovada pela resistência de países como
o Japão. Sarney Filho também enfrentou dois vazamentos de petróleo de
plataformas da Petrobras na costa marinha, e a taxa de desmatamento da
Amazônia ficou estagnada nos três anos em que controlou o ministério, na taxa de 18 mil quilômetros quadrados por ano. Hoje, a taxa está
três vezes menor.
A boa vontade que o novo governo conseguiu
angariar dos ambientalistas com a nomeação de Sarney Filho se dilui,
entretanto, com outras nomeações. A mais polêmica é a do senador Blairo Maggi, presidente da Amaggi, maior empresa do agronegócio brasileiro. Quando
o assunto é meio ambiente, Maggi desperta reações contraditórias. Em seu
primeiro mandato como governador do Mato Grosso (2003-2006), entrou em colisão
direta com os ambientalistas. Criticou fortemente ações do Inpe e do Ibama,
desqualificando os dados de desmatamento da Amazônia, e deu declarações contrárias
à conservação da floresta, dizendo que o ambientalismo representava um
"preconceito contra o setor produtivo". Ganhou o apelido de
"Motosserra de ouro", por parte da ONG Greenpeace e, em 2008, entrou
em uma discussão pública com o então ministro do Meio Ambiente Carlos Minc.
"Se deixar, ele planta soja até nos Andes", disse Minc, na ocasião.
Na segunda metade de seu mandato, Maggi muda o foco. Passa a integrar um fórum
de governadores da Amazônia que busca recursos em esferas internacionais para
proteger florestas e aprova o programa MT Legal, importante marco da
regularização das áreas rurais no Mato Grosso e que acaba servindo como
ferramenta para controlar o desmatamento. Esse tipo de ação fez com que ele
fosse nomeado uma das 100 pessoas mais influentes por ÉPOCA em 2009. Ainda
assim, seu nome não é unanimidade, e, ao relatar uma proposta
que muda o licenciamento ambiental no Senado, voltou a provocar a
fúria dos ambientalistas.
A questão do licenciamento ambiental é outro
exemplo dos sinais contraditórios que o novo governo passa na questão
ambiental. Se por um lado Sarney Filho se manifestou contra uma mudança nas
regras de licenciamento - ele classificou a proposta relatada por Maggi
de "medieval" -, por outro o programa divulgado por Temer, a
"Ponte para o Futuro", defende a flexibilização. Nesse texto, Temer
promete "promover a racionalização dos procedimentos burocráticos com
ênfase nos licenciamentos ambientais". O problema é que, por trás das boas
intenções de tornar o processo mais ágil e eficiente, sempre há a tentativa de
se acabar de vez com as regras ambientais. Desastres como o de Mariana mostram
o que pode acontecer quando faltam rigor e fiscalização com grandes
empreendimentos.
Por fim, as mudanças no Ministério da Ciência
também acendem um sinal de alerta para a política ambiental no país. A pasta,
responsável pelos relatórios de emissão de gases de efeito estufa, foi fundida
com as Telecomunicações e ficará sob o comando do ex-ministro das cidades,
Gilberto Kassab. Na prefeitura de São Paulo, Kassab criou uma lei que previa a
redução nas emissões do município em 30% até 2012. Foi uma iniciativa
importante. Veio num momento em que as gestões estaduais e municipais em todo o
mundo enxergavam que as políticas para reduzir emissões - como melhora dos
transportes e reformas energéticas - seriam boas para a economia e modernização
de suas regiões. Mas a meta não foi alcançada e pouco se fala dela hoje.
Independentemente dos méritos de Kassab, a
união da pasta de Ciência, Tecnologia e Inovação com a de Comunicações é vista
como um sinal de desprezo do governo pelo setor – que sofre, desde 2014,com
cortes sucessivos no orçamento. Entre 2014 e 2015, o orçamento
destinado ao Ministério da Ciência e Tecnologia foi reduzido em 25%. No ano
seguinte, a queda foi de 37%. A contenção tem impacto direto no financiamento
das pesquisas e na qualidade da ciência feita no Brasil. O temor é de que, numa
queda de braço por recursos entre Ciência e Comunicação, a primeira acabe
prejudicada.
Na quinta-feira, entidades do setor emitiram
notas criticando a união das pastas. Um manifesto encabeçado pela Sociedade
Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC) e pela Academia Brasileira de
Ciência (ABC) chama a medida de “artificial”: “É grande a diferença de
procedimentos, objetivos e missões desses dois ministérios”, diz o texto,
divulgado pelas entidades antes que a mudança nos ministérios fosse confirmada.
“A junção dessas atividades díspares em um único Ministério enfraqueceria o
setor de ciência, tecnologia e inovação, que, em outros países, ganha
importância em uma economia mundial crescentemente baseada no conhecimento e é
considerado o motor do desenvolvimento”. A mudança, encarada pelos cientistas
brasileiros como um retrocesso feito em prol da governabilidade, foi destaque
negativo até mesmo na prestigiada revista Nature.
Talvez tão relevante quanto os sinais
contraditórios, nessa primeira análise, sejam as ausências. Não são apenas
mulheres que estão faltando no novo governo. Como o Observatório do Clima bem percebeu, o
primeiro discurso de Temer "primou pela ausência de qualquer menção a
desenvolvimento sustentável". A única vez em que a palavra
"sustentabilidade" foi mencionada foi para se referir à economia. O
meio ambiente também ficou de fora da "Travessia Social" e do áudio
do discurso de Temer vazado antes da hora. Ao que tudo indica, nossas
florestas, rios e clima continuarão amargando o triste segundo plano que já
tinham na administração anterior.
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