Moro durante evento sobre corrupção e Lava-Jato no final de fevereiro em Lima, no Peru - CRIS BOURONCLE / AFP |
SÃO PAULO — Após receber críticas de entidades de jornalistas, o juiz Sérgio Moro pediu proteção de sigilo da fonte em processo do blogueiro Eduardo Guimarães, que edita o “blog da Cidadania” e que foi alvo de mandado de busca e apreensão na terça-feira. O
“Deve ser excluído do processo e do
resultado das quebras de sigilo de dados, sigilo telemático e de busca e
apreensão, isso em endereços eletrônicos e nos endereços de Carlos Eduardo
Cairo Guimarães, qualquer elemento probatório relativo à identificação da fonte
da informação”, escreveu o magistrado em seu despacho.
O juiz afirma que, após ter acesso a
informações sigilosas sobre a 24ª fase da Operação Lava-Jato, a Operação
Alethea, em março do ano passado, o blogueiro avisou um assessor do
ex-presidente Lula sobre os mandados de busca e apreensão que tinham o político
como alvo. Informações sobre a ação policial foram divulgadas pelo “Blog da
Cidadania” dias antes de sua realização.
O blogueiro alega que o objetivo do
contato com o assessor de imprensa do Instituto Lula era checar a veracidade
dos dados que constavam do despacho obtido por ele e publicar informação
correta em seu veículo. O contato foi mencionado pelo próprio blogueiro em post
publicado em 28 de fevereiro de 2016, quando escreveu:
“O Blog, antes de qualquer coisa,
passou a informação ao Instituto Lula, que considerou indubitável a veracidade
da lista de pessoas e empresas que tiveram seu sigilo quebrado porque há
informações, ali, que eram de conhecimento exclusivo da família do
ex-presidente”, escreveu.
No despacho divulgado nesta
quinta-feira, Moro justificou que ao ser inquerido pela polícia, o blogueiro
revelou quem seria a fonte de sua informação imediatamente. Para o magistrado,
um jornalista nunca revelaria sua fonte. Para ele Guimarães é, na verdade,
político, e seu blog, uma plataforma de propaganda eleitoral. Portanto, o
entendimento do juiz era de que o sigilo da fonte não estaria sendo quebrado
porque o blogueiro não teria essa prerrogativa.
Editor do site “Blog da Cidadania”,
Eduardo Guimarães, teve celular e computadores apreendidos pela PF - Reprodução internet
Contudo, o juiz disse ser o caso de
rever sua posição e melhor delimitar o objeto do processo, “tendo em vista o
valor da imprensa em uma livre democracia”.
Na quarta-feira, entidades de
jornalistas divulgaram nota em que manifestavam preocupação com risco de quebra
do sigilo da fonte diante da condução coercitiva e do mandado de busca e
apreensão expedido por Moro contra o blogueiro. O pedido foi feito a Moro pela
Polícia Federal e pelo Ministério Público Federal (MPF) na terça-feira.
A Associação Brasileira de Jornalismo
Investigativo (Abraji) alertou para o risco de quebra de sigilo da fonte deste
e de outros trabalhos do blogueiro, a partir do acesso a seus arquivos pessoais
e profissionais. “Não cabe à Justiça Federal traçar linhas a definir quem é e
quem não é jornalista com o objetivo de afastar prerrogativas constitucionais.
Não há dúvidas de que uma das atividades de Eduardo Guimarães é a manutenção de
seu blog, por meio do qual realiza análises políticas desde 2010, uma atividade
jornalística. Divulgar o que sabe é não apenas um direito de Guimarães, como um
dever”, diz a nota da entidade.
A Abraji ponderou que comunicadores,
blogueiros e jornalistas não estão imunes a investigações “e, se houver indício
de crimes estranhos à atividade de comunicação, devem ser investigados como
qualquer cidadão”. Contudo a entidade ressalva que “não se pode admitir que a
investigação atente contra princípios que garantem o exercício do jornalismo
não apenas ao blogueiro, mas a todos os comunicadores do país”.
Também em nota, a ONG Artigo 19
repudiou a condução coercitiva do blogueiro, tratada como "grave violação
ao direito de sigilo de fonte" e "sério ataque ao direito à liberdade
de imprensa", ao transmitir "sinal intimidatório aos demais
comunicadores que fazem a cobertura da operação Lava Jato".
"O direito ao sigilo de fonte é uma
condição fundamental para a prática do jornalismo investigativo e deve ser
protegido por todas as instituições públicas do país, sobretudo pelo
Judiciário. Qualquer tentativa de se violar esse direito deve ser denunciada e
sofrer firme oposição por parte dos setores da sociedade civil comprometidos
com as liberdades democráticas", escreveram representantes da ONG.
O MPF, por sua vez, argumentou que os
pedidos não pretendiam descobrir a identidade da fonte de Guimarães, uma vez
que os procuradores já teriam investigado e identificado o informante. A
Lava-Jato suspeita que a intenção do blogueiro tenha sido atrapalhar
deliberadamente as investigações e não checar dados. A defesa do blogueiro nega
a acusação.
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