Até políticos
com poucos meses no cargo recebem. Pagamentos são legais, mas questionados na
Justiça. Reforma da Previdência prevê 49 anos de contribuição para se obter
aposentadoria integral.
Endividados e em
crise financeira, os governos estaduais gastam pelo menos R$ 35,8 milhões por
ano com o pagamento de pensões a ex-governadores e dependentes deles. Os
pagamentos são legais, mas tramitam na Justiça várias ações que questionam
essas pensões – no último dia 15, a Justiça da Bahia suspendeu por liminar
(decisão provisória) o pagamento de pensão vitalícia a ex-governadores.
Levantamento do G1 encontrou 16 estados que pagam esses
benefícios. O gasto mensal é de R$ 2,98 milhões. Algumas dessas pensões são
pagas inclusive a quem ocupou o cargo por poucos meses ou poucos dias.
Para chegar a
esse resultado, o G1 pediu a todos os governos
de estados e do Distrito Federal a relação de ex-governadores e dependentes que
recebem pensão e dos valores pagos a eles. Somente o governo da Bahia não
respondeu.
No Mato Grosso,
até governadores interinos têm direito à pensão. Iraci Araújo Moreira, que foi
vice do ex-governador e atual ministro da Agricultura, Blairo Maggi, recebe
mensalmente R$ 15.083,79 (em valores brutos), todos os meses. Ela assumiu o
cargo por alguns dias, durante as viagens internacionais de Maggi.
Maria Valquíria
dos Santos Cruz herdou uma pensão de R$ 15.083,79 mensais. Ela é viúva de
Evaristo Roberto Vieira da Cruz, que foi presidente da Assembleia Legislativa
do Mato Grosso e ganhou direito ao benefício porque exerceu o cargo de
governador por 16 dias.
Leonel
Arcângelo Pavan ocupou a cadeira de governador de Santa Catarina entre 25 de
março e 31 de dezembro de 2010, o que lhe deu direito a uma pensão mensal de R$
23.880,16. Ele era vice de Luiz Henrique da Silveira, que deixou o cargo para
concorrer ao Senado.
O Paraná também
coleciona casos de ex-governadores que ocuparam o cargo por poucos meses e
conseguiram direito à pensão vitalícia. Uma das pensões, de R$ 30.471,11
mensais, é paga a Madalena Gemieski Mansur, viúva de João Mansur, que ficou um
pouco mais de um mês no cargo.
O Pará paga a
maior pensão encontrada no levantamento do G1: R$ 48.753,78
mensais, ao ex-governador Aurélio Correa do Carmo.
A lista de quem
recebe pensão como ex-governador inclui também políticos investigados e até
condenados.
É o caso do
ex-governador e ex-senador mineiro Eduardo Azeredo, condenado a 20 anos e 10 meses de prisão em 2015 pelo
chamado mensalão tucano.
O ex-governador
Pedro Pedrossian, governador do Mato Grosso e do Mato Grosso do Sul, recebe
duas pensões, uma de cada estado: R$ 24.117,64 e R$ 30.471,11, respectivamente,
num total de R$ 54.588,75 por mês.
Ao menos 16 estados pagam pensão a
ex-governadores e dependentes deles (Foto: Arte/G1)
49 anos
de contribuição
O Congresso já
começou a discussão sobre a proposta de reforma da Previdência enviada
pelo presidente Michel Temer. A principal mudança prevista é que homens e
mulheres só terão direito à aposentadoria pelo INSS a partir dos 65 anos.
A proposta
também prevê que os trabalhadores precisarão contribuir para o INSS por 49 anos para ter direito à
aposentadoria integral, ou seja, equivalente ao salário. Esse
valor, porém, tem um teto, que hoje é de R$ R$ 5.531,31, bem mais baixo que a
maior parte das pensões pagas a ex-governadores e suas viúvas.
O levantamento
do G1 mostra que pelo menos 16 estados brasileiros
pagam pensão vitalícia: Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Paraná, Rio de
Janeiro, Minas Gerais, Sergipe, Paraíba, Rio Grande do Norte, Maranhão, Piauí,
Pará, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Amazonas, Acre e Rondônia.
Procurado pelo G1, o governo da Bahia não respondeu aos pedidos de
informações sobre pagamento de pensões. Entretanto, no último dia 15, uma
liminar (decisão provisória) da Justiça suspendeu o pagamento de pensões a ex-governadores do estado.
O governo de
Sergipe informou o valor das pensões pagas a viúvas, mas não divulgou o nome
delas. O Piauí, que paga pensão a seis ex-governadores e dois dependentes, não
informou os nomes deles.
Quem
recebe?
Ao todo, 76
ex-governadores recebem pensão dos estados citados. Desses, 18 acumulam o
benefício com aposentadoria de deputado ou senador e chegam a ganhar mais de R$
50 mil por mês.
Há ainda outros
55 dependentes de políticos, a maioria viúvas, que recebem pensão dos estados.
Dezoito desses dependentes também acumulam pensões do Congresso.
O levantamento
do G1 encontrou ainda 12 políticos que exercem
atualmente mandato de senador ou deputado federal e que acumulam salário de
congressista e pensão como ex-governador.
Considerando
apenas ex-governadores (ou seja, sem contar viúvas), a menor pensão encontrada
no levantamento é de R$ 10,5 mil mensais, paga a Francelino Pereira dos Santos
e Eduardo Azeredo, que governaram Minas Gerais.
O estado com a
maior despesa é o Maranhão: R$ 4,38 milhões por ano. Em segundo lugar está o
Rio Grande do Sul, com um gasto de R$ 4 milhões ao ano. O Rio Grande do Sul é
um dos estados com situação financeira grave e que negocia um socorro do governo federal.
O Rio de
Janeiro, estado com a pior situação fiscal do país e que vem
atrasando salários de servidores e pagamento a fornecedores, gasta mais de R$ 2
milhões por ano com as pensões.
Supremo
A discussão
sobre a legalidade do pagamento de pensões está no Supremo Tribunal Federal
(STF), que já suspendeu, por exemplo, o pagamento do benefício pelo governo do
Pará.
O estado, no
entanto, mantém o pagamento das pensões, numa despesa mensal de R$ 275 mil. A
assessoria do governo informou que o jurídico estadual entende que a decisão do
STF afeta apenas o pagamento de novas pensões.
O STF analisa
ações semelhantes contra o pagamento de pensão vitalícia para ex-governadores
do Acre, Paraíba, Piauí, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul, Rondônia e Sergipe.
Em alguns
desses estados, a pensão não é mais garantida a novos governadores, mas
continua sendo paga àqueles que adquiriram o direito por terem deixado o cargo
quando a respectiva lei ainda estava vigente. É o caso do Piauí e do Rio Grande
do Norte.
Há casos ainda,
como no Paraná, em que o governo chegou a suspender o pagamento das pensões,
mas os ex-governadores recorreram à Justiça para continuar recebendo o
benefício.
Beneficiários
justificam
Por intermédio
do marido, Roberto França, a ex-vice-governadora do Mato Grosso Iraci Araújo Moreira França informou que o
recebimento da pensão é legal.
O ex-governador
do Pará Aurélio Correa do Carmo disse considerar
"justa" a pensão de R$ 48,7 mil que recebe. "Eu recebo uma
pensão como ex-governador do estado, que foi aprovada pelo Supremo [STF], pois
ela é de antes da Constituição de 88". Segundo ele, o valor da sua pensão
é maior que a de outros ex-governadores porque está somada à que ele recebe por
ser desembargador aposentado. "Então, a soma destas duas é que chega a
esse valor. Eu acho merecido o que eu recebo", disse Carmo. "Eu não
acho injusto receber um pagamento pelo que me é devido. Eu tenho direitos
adquiridos, julgados a meu favor", completou.
Por meio do
advogado, Eduardo Azeredo informou que
"a pensão especial que me é paga pelo Governo de Minas é fruto de decisão
judicial, que a considerou justa e devida".
O ex-governador
mineiro Francelino Pereira dos Santos, de 95 anos,
informou, por meio de sua secretária, que dedicou 55 anos à vida pública e que
a lei o protege. A secretária informou ainda que o valor que ele recebe é um
pouco diferente: R$ 10.236,76. O valor da pensão recebida por Francelino foi
informado ao G1 pelo governo de Minas
Gerais.
A família do
ex-governador do Mato Grosso e do Mato Grosso do Sul Pedro Pedrossian informou que prefere "não
falar sobre esse assunto, até porque em todos os questionamentos sobre esses
pagamentos, a Justiça está dando ganho de causa a ele".
O G1 não localizou Maria Valquiria dos Santos Cruz,
viúva do ex-governador do Mato Grosso Evaristo Roberto Vieira da Cruz.
Também não conseguiu contato com Madalena Gemieski Mansur, viúva do
ex-governador do Paraná João Mansur.
A reportagem
também não obteve resposta da assessoria do ex-governador de Santa Catarina Leonel Pavan.
* Colaboraram G1
RS, G1 SC, G1 PR, G1 MG, G1 SE, G1 PB, G1 RN, G1 MA, G1 PA, G1 MT, G1 MS, G1 AC
e G1 RO.
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