Quanto mais velhos os pais no momento da concepção, maiores as chances
de ocorrência de problemas de saúde nos filhos, segundo novo estudo
RIO — A idade dos pais é um conhecido fator de risco para o
nascimento de crianças com problemas de saúde física ou mental. Diversos
estudos associam esta variável ao desenvolvimento de condições que vão da asma
ao autismo. Também podem ocorrer anomalias cromossômicas relativamente comuns,
como a síndrome de Down, e doenças monogênicas, que são causadas por defeitos
em apenas uma das cópias de um gene que temos em nossos pares de cromossomos —
é o caso, por exemplo, das síndromes de Apert e Crouzon, que provocam graves
deformidades craniofaciais.
Mas o ritmo de surgimento
das novas mutações genéticas nas chamadas linhas germinativas de homens e
mulheres — ou seja, nos espermatozoides e óvulos — e como são passadas para
seus filhos é radicalmente diferente, mostra estudo publicado ontem na revista
científica “Nature”, que analisou o genoma de mais de 1,5 mil “trios” de
indivíduos islandeses com seus pais, e desses, pelo menos 225 “quartetos”: o
indivíduo, seus pais e seu filho.
CONTRIBUIÇÃO DESPROPORCIONAL
Segundo os pesquisadores
liderados por Kari Stefansson, presidente da empresa deCODE, responsável pelo
sequenciamento dos genomas usados no estudo, as análises dos trios e quartetos
permitiram a identificação de quase 110 mil destas mutações novas, das quais 43
mil puderam ser atribuídas a um dos pais. E a desproporção da contribuição
deles e delas no surgimento destas alterações no DNA da prole com o passar da
idade é gritante: mais de 80% das que puderam ser atribuídas foram associadas
aos pais, emergindo a um ritmo de 1,51 por ano, mais de quatro vezes mais
rápido que o 0,37 anual da idade da mãe.
— Este é um importante
capítulo novo no nosso trabalho em curso para entender os mecanismos por trás
de nossa diversidade genética e, por meio deles, a evolução de nossa espécie —
destaca Stefansson, também professor da Universidade da Islândia e cujo grupo
já havia ligado anteriormente a idade paterna a um maior risco de autismo nos
filhos. — Mutações do tipo de novo, ou novas, são um importante substrato
para a evolução, lançando um constante fluxo de novas versões do genoma humano
no ambiente. Mas elas também são apontadas como responsáveis pela maior parte
dos casos de doenças raras na infância. Assim, fornecer um catálogo abrangente
de tais mutações em toda uma população não é apenas cientificamente
interessante, como também uma importante contribuição na melhora do diagnóstico
de doenças raras.
Chefe do Laboratório de
Biologia Molecular do Hospital Universitário Clementino Fraga Filho (UFRJ),
Mariano Zalis destaca que o estudo é uma “quebra de paradigma”.
— Sabemos que as mutações
genéticas não são provocadas apenas pelo envelhecimento do óvulo. O mesmo pode
ocorrer com o espermatozoide — ressalta. — Então, o pai também tem responsabilidade
em fenômenos como a quebra da dupla hélice do DNA, ou na troca de aminoácidos
dentro de um gene, o que pode afetar o seu funcionamento.
Zalis assinala que, quando
as mutações resultam em uma doença rara, é necessário sequenciar o genoma do
paciente para entender suas características e certificar-se de que a
enfermidade não tem relação com o histórico familiar, sendo, portanto, de fato
fruto de uma alteração no DNA do tipo de novo.
Segundo Allan Pacey,
professor da Universidade de Sheffield, Reino Unido, a diferença no ritmo de
surgimento de novas mutações nas linhas germinativas de homens e mulheres
estaria relacionada ao modo como os próprios espermatozoides e óvulos são produzidos.
— Nas mulheres, todos os
óvulos são produzidos ao mesmo tempo e muito cedo na sua vida, a maior parte
antes mesmo dela nascer, e assim há poucas oportunidades para a ocorrência de
mutações espontâneas devido à divisão celular — explica. — Já nos homens a
produção de esperma é um processo contínuo, da puberdade até a morte, e assim
provavelmente há muito mais oportunidades para erros genéticos se infiltrarem
no processo de divisão celular responsável pela produção dos espermatozoides.
E é justamente por isso
que o especialista lembra que o governo britânico estabeleceu um limite de
idade para doadores de esperma, com os homens devendo ter, no máximo, 40 anos.
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