'Sem-tetos' desfilam em picapes de luxo no AM.

Como numa fábrica do Distrito Industrial, invasão tem troca de turnos e transporte em caminhonete Hilux, veículo cujo preço pode alcançar os R$ 145 mil

A desocupação deveria ter sido realizada até as 18h da última segunda-feira. No entanto, a Prefeitura de Iranduba optou por esperar o prazo esgotar para se reunir com o Gabinete de Gestão Integrada da Polícia Militar (GGI) a fim de definir a estratégia de reintegração

Como numa fábrica do Distrito Industrial, invasão tem troca de turnos e transporte em caminhonete Hilux, veículo cujo preço pode alcançar os R$ 145 mil (Euzivaldo Queiroz)
A reintegração de posse no terreno invadido por índios e não índios, no km 4 da rodovia Manoel Urbano (AM-070), ainda não tem data para ser realizada pelo Comando da Polícia Militar. Até o início da manhã desta terça-feira (3), havia a informação que a desocupação ocorreria nesta quarta (4), 37 horas depois do fim do prazo estabelecido pela Justiça, mas foi desmentida pelo comandante da 8ª Companhia Independe da PM, Marcos Santiago.
A desocupação deveria ter sido realizada até as 18h da última segunda-feira. No entanto, a Prefeitura de Iranduba optou por esperar o prazo esgotar para se reunir com o Gabinete de Gestão Integrada da Polícia Militar (GGI) a fim de definir a estratégia de reintegração. São dois dias de atraso e de descumprimento da liminar da Justiça em favor da igreja Assembleia de Deus do Amazonas e União, proprietários do terreno.
A CRÍTICA acompanhou, nesta terça (3), a troca de turno dos invasores, durante a madrugada e o início da manhã, no último dia no terreno. A movimentação de pessoas e carros, inclusive de luxo, como a picape Hilux avaliada em R$ 145 mil e S 10 Deluxe Executive, fica intensa com a proximidade do raiar do sol.
Enquanto a noite dá lugar ao dia, centenas de pessoas deixam a invasão em direção a rodovia AM-070 e conversam com outras que as substituem. Elas levam colchões, garrafas térmicas, cobertores e até cachorros. Carros e motos entram e saem do terreno transportando pessoas. Ônibus que fazem linha para Iranduba e Manacapuru chegam lotados até a entrada da invasão e ficam praticamente vazios com a descida das pessoas que vão passar o dia nos barracos de lona construídos desordenadamente em meio a árvores.
A CRÍTICA apurou que a troca de turno é uma determinação dos lideres da invasão para que o barraco não fique vazio. A medida também é estratégica para dificultar e tentar frustrar qualquer tentativa de retirada dos invasores.
O pico da movimentação na invasão ocorre entre 6h30 e 7h30. Mulheres e homens idosos, jovens e até crianças chegam à invasão, principalmente de Manaus, em grupos. As duas entradas são constantemente monitoradas por “índios chamados “guerreiros” que ostentam lanças, arcos e flechas. Eles controlam a entrada e saída das pessoas. Porém entre as 6h40 e 7h, ambas as entradas ficam descobertas e qualquer carro ou pessoa pode entrar.
Ocupação tem apoio logístico
A invasão iniciada com o pretexto de reivindicar moradia para índios tem, atualmente, mais invasores brancos que indígenas. Contudo, a área continua sob o controle de lideranças indígenas. No terreno existem supostos índios mundurucu, mura, sateré-mauwé, miranha e apurinã. Todos se recusam a sair. Eles recebem ajuda de “agentes” que levam água potável e alimentos para o terreno. A água é levada em camburões transportados em picapes. Também existe um pequeno igarapé logo após a entrada da invasão que é usado para lavar roupa e louça.
É possível no interior do terreno que dezenas de árvores foram derrubadas, agravando o crime ambiental. Parte da madeira ainda é usada como lenha nas fogueiras onde a comida é cozida. A falta de higiene e de condições de moradia é evidente. Os barracos são feitos de lona plástica azul e preta. Logo no início da manhã é difícil permanecer nas moradias improvisadas por conta do calor. Em outros pontos é possível ver construções mais sofisticadas em comparação com os barracos.
Apoio externo
O que mais chama atenção é como os índios fazem o monitoramento do terreno. Outra equipe de indígenas usa duas picapes modelo S 10 para percorrer a área. Cada varredura acontece num intervalo de 30 minutos. Os índios armados ficam em pé na picape enquanto ela se desloca e buscam minar qualquer movimento que aparente ser ameaça para o terreno. Na outra ponta, olheiros ficam em lugares estratégicos para acionar os “guerreiros” caso vejam alguém ou veículo suspeito.
Comando vai definir dia da ação
O comandante da 8ª Companhia Independe da PM, Marcos Santiago, informou na manhã desta terça (3) que espera apenas pela definição da data da reintegração pelo comando da corporação. Ele esclareceu que o processo só ocorrerá depois da reunião da GGI com a Prefeitura de Iranduba. “O Comando Geral pediu prorrogação, mas é muito provável que seja essa semana. A reintegração deveria ter sido realizada dentro do período estabelecido, mas a partir do momento que as pessoas da invasão ficam sabendo da liminar começam a deixar o terreno espontaneamente e o número de ocupantes diminui”, disse.
As lideranças realizaram uma reunião geral às 7h20, no centro da ocupação, logo após ouvirem no rádio que a reintegração havia sido cancelada. A estratégia para convocar todos os ocupantes que estavam dispersos no terreno foi usar fogos de artifício como aviso. Apenas os “guerreiros” permaneceram nas entradas da invasão enquanto os ocupantes discutiam como vão permanecer na área caso a polícia cumpra a determinação da Justiça.
De acordo com cálculos da polícia, 22 mil é o número atual de pessoas na invasão. Os barracos se amontoam em direção ao interior do terreno. Anteriormente, os invasores mantinham espaços entre os barracos, mas com a chegada de mais pessoas o movimento desordenado de construções agravou a situação do local. Apenas índios ocupavam área inicialmente e permitiram que milhares de outras pessoas entrassem por dois motivos: ampliar a invasão e dificultar uma reintegração.

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