A
maioria da primeira turma do STF (Supremo Tribunal Federal) firmou o
entendimento, na terça-feira (29), de que praticar aborto nos três primeiros
meses de gestação não é crime. Votaram dessa forma os ministros Luís Roberto
Barroso, Rosa Weber e Edson Fachin.
A
decisão é sobre um caso específico, em um habeas corpus que revogou a prisão
preventiva de cinco pessoas que trabalhavam numa clínica clandestina de aborto em Duque de Caxias (RJ), mas
pode ser considerada um passo à frente na descriminalização do ato, desde que
no início da gravidez.
Embora
a decisão tenha se dado em um caso específico, outros magistrados, de outras
instâncias, poderão, a seu critério, adotar o entendimento da primeira turma do
STF.
O
relator, ministro Marco Aurélio, já havia concedido liminar em 2014 para soltar
os cinco médicos e funcionários da clínica fluminense. Seu fundamento era que
não existiam os requisitos legais para a prisão preventiva (como ameaça à ordem
pública e risco à investigação e à aplicação da lei). Nesse processo, nenhuma
mulher que praticou aborto na clínica foi denunciada.
Em
agosto deste ano, quando foi a julgamento o mérito do habeas corpus, Barroso
pediu vista. Em seu voto, nesta terça, ele concordou com a revogação das
prisões pelos motivos apontados por Marco Aurélio, mas trouxe um segundo
fundamento. Para ele, os artigos do Código Penal que criminalizam o aborto no
primeiro trimestre de gestação violam direitos fundamentais da mulher.
As
violações são, segundo o voto de Barroso, à autonomia da mulher, à sua
integridade física e psíquica, a seus direitos sexuais e reprodutivos e à
igualdade de gênero. “Na medida em que é a mulher que suporta o ônus integral
da gravidez, e que o homem não engravida, somente haverá igualdade plena se a
ela for reconhecido o direito de decidir acerca da sua manutenção ou não”,
escreveu o ministro sobre o direito à igualdade de gênero.
“O
direito à integridade psicofísica protege os indivíduos contra interferências
indevidas e lesões aos seus corpos e mentes, relacionando-se, ainda, ao direito
à saúde e à segurança. Ter um filho por determinação do direito penal constitui
grave violação à integridade física e psíquica de uma mulher”, afirmou também o
ministro.
Além
disso, segundo Barroso, a criminalização do aborto causa uma discriminação
contra as mulheres pobres, que não podem recorrer a um procedimento médico público e seguro, enquanto as que têm
condições pagam clínicas particulares.
Ainda
de acordo com o voto de Barroso, que foi acompanhado por Weber e Fachin, os
principais países democráticos e desenvolvidos, como Estados Unidos, Alemanha,
Reino Unido, Canadá, França, Itália, Espanha, Portugal e Holanda, não
criminalizam o aborto na fase inicial da gestação. O prazo de três meses foi
tirado da comparação com esses países.
Os
dois outros ministros da primeira turma, Marco Aurélio e Luiz Fux, não se
manifestaram sobre a descriminalização do aborto no início da gravidez. No caso
específico, eles também votaram pela revogação das prisões preventivas, com
base apenas na ausência dos requisitos legais para mantê-las.
Barroso
destaca, em sua decisão, que o aborto não é algo bom, e que o papel do Estado
deve ser evitá-lo, mas com educação sexual, distribuição de contraceptivos e
apoio às mulheres que desejarem manter a gravidez, mas que não tenham
condições.
O
que foi julgado na primeira turma foi um habeas corpus para reverter a prisão
preventiva dos cinco acusados. O mérito desse caso continua a ser julgado na
Justiça do Rio.
No
próximo dia 7, o plenário do Supremo julgará a possibilidade de aborto em casos
em que mulher for infectada pelo vírus da zika.
Em
2012, a corte decidiu, por 8 votos a 2, que a interrupção de gravidez no caso
de fetos com anencefaliacomprovada não é crime. Na ocasião,
Barroso, que ainda não era ministro, advogou a favor da descriminalização.
Fonte: Folha de São Paulo
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