Fixação de
preços mínimos fará com que o transporte de itens como soja, milho e açúcar
suba pelo menos 70%, mas alta pode chegar a 154%. Lei gera incertezas na
indústria e no agronegócio.
A greve dos caminhoneiros
trouxe de volta à agenda econômica uma série de práticas que o Brasil – ou pelo
menos uma parte dele – está tentando enterrar: subsídios para combustíveis e
tabelamento de preços. Tudo com o cheiro de naftalina dos anos 70.
Uma das “vitórias” da
categoria, o tabelamento do frete já começou a fazer estragos na economia.
Segundo estudo da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz, da
Universidade de São Paulo (Esalq), com a imposição da tabela, o aumento do
frete para itens como soja, milho, farelo de soja e açúcar será de 70%, mas
pode chegar a 154% se o contratante também pagar o frete de retorno.
Na pressa de acabar com a
greve, o governo produziu uma medida provisória confusa que potencializou o
grau de incerteza para quem contrata o frete, e a resolução da Agência
Nacional de Transportes Terrestres (ANTT), que deveria detalhar a medida, não
ajudou.
A regra da ANTT não
explica o tipo de caminhão que faz jus ao valor estipulado. Um exemplo: a
tabela só deu preço para o caminhão de cinco eixos, enquanto o agronegócio
tipicamente opera com caminhões de sete, oito ou nove eixos.
“Eixo carregado”
A medida provisória também
faz referência ao “eixo carregado,” mas a ANTT tabelou até o “frete
de retorno”, dando a entender que, mesmo quando o caminhão está voltando
vazio, o contratante teria que pagar o frete, o que não é uma prática de
mercado. Finalmente, o Congresso inseriu na lei o seguinte dispositivo: se o
diesel variar 10% para cima ou para baixo, a tabela terá que ser revisada, mas
isso não aconteceu ainda.
A penumbra jurídica já
está dificultando as negociações entre agricultores e trading companies para
o plantio da safra 2018/2019. De agora até outubro, quando começarão a colocar
as sementes na terra, os fazendeiros negociam com empresas como Cargill, ADM e
Bunge a venda antecipada de parte da safra. Um fazendeiro que estima colher 55 sacas
por hectare pode querer vender 30 sacas à trading company como forma
de cobrir seus custos de plantio.
Nas conversas deste ano,
em vez de buscar o grão na fazenda como sempre fizeram,
as tradings estão pedindo que o agricultor entregue os grãos nas suas
unidades de transbordo, ou então forçando um desconto maior por não
conhecer o custo do frete.
As operações de “barter” –
nas quais o fazendeiro troca insumos como pesticidas e adubo por sacas de grãos
– também estão complicadas. Antes, o insumo vinha no frete de retorno, que
é 40% mais barato que o frete de ida. Agora, ninguém sabe o custo, e a corda
está arrebentando do lado do agricultor. Em vez de apostar na concorrência para
que o mercado encontre o preço justo, o governo cedeu à pressão e resolveu privilegiar
o caminhoneiro em detrimento do dono da carga.
Três entidades de classe —
a Confederação Nacional da Agricultura, a Confederação Nacional da Indústria e
a ATR (Associação do Transporte Rodoviário) — foram ao Supremo contestar a
constitucionalidade da MP. O relator do caso é o ministro Luiz Fux, que, no dia
27, fará uma audiência pública para ouvir as partes.
Nesta quarta-feira, oito
entidades de classe da indústria e do agronegócio vão expor o problema em
Brasília. O seminário “Frete sem tabela, Brasil com futuro” vai debater o frete
tabelado sob três ângulos: o econômico, o jurídico e o político.
O evento começa com uma
mesa sobre economia em que os debatedores serão Cláudio Frischtak, da Inter.B
Consultoria, e Pedro Scazufca, sócio da GO Associados. Depois, haverá um
painel sobre a atuação do Judiciário e a insegurança jurídica com a
ex-corregedora do Conselho Nacional de Justiça, Eliana Calmon, e o
advogado Beto Vasconcellos, ex-secretário nacional de Justiça. Finalmente,
o deputado federal Evandro Gussi (PV-SP) e Fernando Schüler, professor do
Insper, debaterão o tabelamento no contexto do cenário político
e institucional.
Fonte: Correio Braziliense
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